terça-feira, 27 de março de 2012

Absurdos discursos

No jantar anual. A rua estava calma. Uma sombra estava a segui-lo.
Um jovem gordo, amarelado, ramelado, com um passo ruidoso sorria.
No fundo Zé era um fanfarrão. Hoje faltava-lhe um sapato que estava no fundo da sala perdido e ele estava zangado. Estendeu os braços carinhosamente mas não o alcançou, era demasiada a gordura!

- Boas noites senhor.
- Boa noite.

Que Karma o dele, ter de aturar aquele bigorrilhas que tem sempre uma solicitude matreira.
Subitamente, em posição de rosnido feroz, ele entrou em pânico, tropeçou numa jovem e disse:
- Xiça!
Uivava com dores e só praguejava, parecia falar russo.
- Olha, aguenta-te, disse ela.

Valter deu um passo atrás. Pediu desculpa, uma desculpa entaramelada, quase engolindo o cigarro, cuspiu e caminhou em frente.

- Vejam bem ali, aquele ser viscoso e libertino todo convencido, disse ela.

O calor continuava visceral, sólido e exacto. Mais um momento e desmaiava.

- Vamos já tratar disso. Ora vire-se para lá, disse o médico.

Um bolo abominável sorria e ele tremendo tirava o creme que lhe escorria entre os olhos. Por fim, levantou-se e atirou, ofendido, um murro demolidor ao bolo no balcão.

quarta-feira, 21 de março de 2012

Escrevendo imagens

1ª imagem: Aquele é o braço de uma senhora que está atrás da porta que dá para um enorme jardim. A senhora fica com o braço estendido atrás da porta. Ela pede esmola para apanhar o comboio, mas em silêncio e sem rosto.

2ª imagem: Gosto do teu jeito desajeitado e do teu sorriso escancarado, o muro cinzento atrás só o enaltece.

3ª imagem: O muro perdeu-se dentro do sapato preto do homem que o descalçou a correr para ir segurar outro muro.

4ª imagem: Porque me olhas de lado?
Para não ficares constrangido.
E tu?
Porque tenho uma pala no olho.

5ª imagem: Eu tenho uma boneca na mão, mas o que eu queria era estar ao colo da minha mãe.

6ª imagem: Ela deixou os seus restos caídos no chão e com o que ainda conseguiu levar criou o seu novo rosto.

7ª imagem: Que vida poder ter uma cadeira vazia? Talvez o vazio que existe nela! Não me vou sentar, só contemplar.
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