quarta-feira, 31 de agosto de 2005

A ti presença!

Só Ele é que não morre, por isso é que anda sempre tão descansado, já nós andamos pelo mundo com medo de acordar cada dia de cara virada para o escuro. Ele não tem necessidades, ou se as tem são as que ele criou enquanto nós, sem pedirmos nada ficamos aqui sentados a dizer mal de si e das suas benfeitorias.
Estou longe de casa, acordei à uma semana e desde aí que nunca mais deixei de conseguir andar por estas terras, nem devem perguntar por mim, se o fizerem é para saber quando é que eu morri. Este ar despojado, magro, e sujo que trago é fruto do amor, quero estar contigo em qualquer lado, eu não chateio, não digo nada! Vê-se mesmo que nunca amaste ninguém e vives o tempo a dizer que criaste isto tudo, e ainda por cima dizes que amas a todos de igual forma, se nem eu consigo amar-te de forma igual… Começo a ter pena de ti e nunca pensei, ter pena do criador dos oceanos, ter pena do meu criador, será que o caminho está tão duro assim ou sou eu que já deliro de cansaço? Porque é que todos nós queremos atingir a própria felicidade ou paz? Quem nos disse que viemos para aqui com esse objectivo? Não desconverses nem finjas que estas perguntas não têm resposta, olha para mim e dá-me uma resposta. Detesto que não me respondam e tu detestas quem te contrariem, eu estou a contrariar-te, estou aqui a lançar uma série de caroços que não vão dar frutos. Assim não temos vida e eu não acredito em ti, estou aqui nua à tua frente e tu fazes os dias passarem como se fossem séculos rápidos a raspar por entre as nuvens e lagos. Projectas-me para longe da tua teimosia e fazes um espectáculo para mim, eu quero-te! Digo-te isto e tu dizes-me que há muitos anos que eu minto, pois eu digo que não, há muitos anos que eu apago as letras escritas no computador num simples gesto de pressão impensada. Eu não encontrei nada a não ser crianças a serem vendidas ao preço do pão duro de à quinze dias, e a própria certeza da morte. Diz-me quem tu és, não podes ser Ele, não aparecias assim só para mim, pura ilusão.
Sempre olhei para ti durante toda esta viagem desde casa e agora é que sinto falta dele, porque é que só sentimos falta daquilo que desaparece? No fundo tudo mudou, agora sinto que quero estar contigo deitada num barco longe de tudo e no meio do imenso mar com todos os peixes a guardarem as nossas perguntas e a fugirem dos outros refugiando-se no nosso amor. Aqui estamos seguros de que a mortalidade só serve para aqueles que lavam os dentes todos os dias a rezar para a imagem errada, talvez feita por ti mesmo – Deus.

terça-feira, 30 de agosto de 2005

Vivemos no abismo

O limite entre o ter algo e o não deter nada é o preenchimento! Estamos cheios de trabalho, tristeza, indiferença, ousadia, esperança e tenacidade; oscilamos entre o tudo e o nada do objecto, entre o abjecto e o devoto. Dá-se o enchimento e quando estamos preparados para a explosão simplesmente algo acontece mas a cavilha não se solta, completa-se com o resto da paisagem. O fogo faz parte do nosso sorriso, o mar do nosso olhar, a terra das nossas almas e o ar da nossa suspensão, todos os elementos vêm da mais perfeita criação que se adapta a todos os extremos afiados e cortantes. É aquela que cria e consome, que quer e despreza, que come e vomita, a que reza e crepita sobre o mais escaldante dos romances… Temos uma criação que vive no mais cheio e prazeroso dos espaços, o abismo!

sexta-feira, 19 de agosto de 2005

Pauta

É incrível como desconhecemos essa tal de essência da alma, e ainda assim sentindo quando e onde ela se parte e desvanece com a precisão e incisão de uma navalha. E hoje, o céu que cobre todas as almas parece compadecer-se e juntar todos esses fragmentos perdidos e adoçá-los em leves nuvens passantes, que sinto o vento levar.
Mil e uma ideias brotam com o único sentido de não estarmos sós, são as mesmas que correm na direcção da solidão. E quanto mais viajo com as minhas ideias, mais percebo que voltarei a casa sempre que quiser, mesmo não sabendo onde moro. Habito essa terra que é de ninguém, a não ser de mim, que por vezes é apenas um par de versos quase fatais, e outras vezes é uma confusão tão grande de cheiros que é divertido perceber qual é o meu lá. Tantas vezes esta vida é frenética, quase as mesmas precisávamos nós que o não fosse. E essas vezes e mais outras não sabemos o que queremos, e eu deixei-me dessa ideia porque sei que me quero a mim e aprendi o que sou, alternando a distância a que me olho.
É incrível o número de vezes que pensamos que perdemos a nossa alma e vida para sempre. São tantas vezes quanto nos apercebemos, com lágrimas de alegria, que o mundo é o nosso lar e é música composta por nós.

terça-feira, 16 de agosto de 2005

Londres - Fora de Serviço

É uma cidade feita para todos os desconhecidos se sentirem em casa, para todos os que têm cultura serem aculturados e para os que não a têm o afirmarem de novo depois de a terem perdido. Não sei quem pensou tudo aquilo, mas algo falha, no meio de tanta perfeição existe um ligeiro sabor a imperfeito, a inacabado e sobre-evoluído.
Tanto estamos na multidão como no silêncio dos que vivem longe dela, tanto chove como faz sol, e tanto se percebe como não... Existe lá um epicentro de paradoxos ilógicos; existem câmeras e privacidade, organização e ilegalidade, e a moeda mais forte que ajuda os mais fracos a viverem sonhando com o seu país. É uma vida de oportunidades em que os pobres lá são ricos noutro lugar, e em que os ricos fazem fortuna em todo o lado.
Londres é um aglomerado de pessoas que não se olham umas às outras mas pedem desculpa por um autocarro se encontrar fora de serviço porque o seu dia de trabalho terminou.
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